Todos nós somos um pouco Enriques
É talvez a minha história de futebol preferida. Conta-a Jorge Valdano, que estava lá e supostamente ouviu - ou inventou, o que só reforçaria o seu mérito.
No fim do Argentina-Inglaterra de 1986, no meio do delírio que se imagina no balneário do estádio Azteca, todos comentavam, incrédulos, o segundo golo de Maradona. Aquele toque anónimo de Enrique, a meio-campo, tiro de partida para uma corrida iniciada em carrossel, antes de um-dois-três-quatro-três-cinco ingleses (aquele duplo três é porque Sansom foi fintado duas vezes) ficarem pelo caminho. O último toque em esforço, com o pé esquerdo, o desfile de consagração rumo à bandeirola de canto, a certeza absoluta de ter acontecido um milagre ali, à vista de todos.
E entre os gritos eufóricos de quem acaba de atingir o topo do mundo, há Maradona que se encaminha sorridente para o duche. Sob o jacto de água já está Enrique, condenado a entrar e sair da História como o homem que fez o último passe antes de o seu capitão se tornar imortal. Enrique já o percebeu. Sabe que nunca será mais, nem menos, do que o homem que mudava os aparos a Shakespeare, o afinador de pianos de Mozart, o carregador de mármores para Miguel Ângelo. Por isso, com toda a altivez de que é capaz, atira-lhe a frase, magnífica e perfeita:
- Também, se tivesses falhado o golo depois do passe que te fiz...
Lembrei-me desta história ao reencontrar José Mourinho, no sábado, no Ritz. Já não falava cara a cara com ele há mais de dois anos, desde a final da Taça UEFA, em Sevilha. Lembrei-me das crónicas que enviava para o nosso site, enquanto era um jovem técnico ambicioso à espera de uma oportunidade. Lembrei-me de uma ou outra vírgula fora do sítio, uma ou outra gralha exterminada dos seus textos e senti-me um verdadeiro Enrique. Não disse, mas devia ter dito, com toda a superioridade moral que o descaramento empresta:
- Também, se não te tivesses tornado o melhor treinador do mundo depois da classe com que tratei dos teus mails...
(by Espoliado de Incheon)
No fim do Argentina-Inglaterra de 1986, no meio do delírio que se imagina no balneário do estádio Azteca, todos comentavam, incrédulos, o segundo golo de Maradona. Aquele toque anónimo de Enrique, a meio-campo, tiro de partida para uma corrida iniciada em carrossel, antes de um-dois-três-quatro-três-cinco ingleses (aquele duplo três é porque Sansom foi fintado duas vezes) ficarem pelo caminho. O último toque em esforço, com o pé esquerdo, o desfile de consagração rumo à bandeirola de canto, a certeza absoluta de ter acontecido um milagre ali, à vista de todos.
E entre os gritos eufóricos de quem acaba de atingir o topo do mundo, há Maradona que se encaminha sorridente para o duche. Sob o jacto de água já está Enrique, condenado a entrar e sair da História como o homem que fez o último passe antes de o seu capitão se tornar imortal. Enrique já o percebeu. Sabe que nunca será mais, nem menos, do que o homem que mudava os aparos a Shakespeare, o afinador de pianos de Mozart, o carregador de mármores para Miguel Ângelo. Por isso, com toda a altivez de que é capaz, atira-lhe a frase, magnífica e perfeita:
- Também, se tivesses falhado o golo depois do passe que te fiz...
Lembrei-me desta história ao reencontrar José Mourinho, no sábado, no Ritz. Já não falava cara a cara com ele há mais de dois anos, desde a final da Taça UEFA, em Sevilha. Lembrei-me das crónicas que enviava para o nosso site, enquanto era um jovem técnico ambicioso à espera de uma oportunidade. Lembrei-me de uma ou outra vírgula fora do sítio, uma ou outra gralha exterminada dos seus textos e senti-me um verdadeiro Enrique. Não disse, mas devia ter dito, com toda a superioridade moral que o descaramento empresta:
- Também, se não te tivesses tornado o melhor treinador do mundo depois da classe com que tratei dos teus mails...
(by Espoliado de Incheon)
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